Pessoas da convivência de Telê Santana revelam faces do
mineiro que cravou página heroica na história do futebol

Vinícius Dias

Meados da década de 1950. Sobre a mesa, o rádio ligado, já sintonizado nas principais estações cariocas. Ao redor dela, boa prosa, familiares em confraternização. O engenhoso Telê Santana da Silva, meia-direita recém saído de Itabirito, já titular do Fluminense/RJ, era o alvo das atenções. Acompanhar a jornada esportiva, ouvir seu nome, deixava os itabiritenses extasiados. A terra via nascer o ídolo. Os antigos amigos eram alegria em estado puro.
Um dos privilegiados, Luiz Corradi Júnior, hoje aos 83 anos, ainda recorda aqueles tempos. "Quando a família de Dr. Alberto (Woods Soares) o levou para o Rio, restava a nós a alegria de ficar ao pé do rádio para ouvir as transmissões das partidas do Fluminense. Quando ele marcava um gol, a gente vibrava. Apesar de que éramos botafoguenses, nós torcíamos pelo sucesso", fala.

Telê, em Itabirito, ao lado de amigos
(Créditos: Arquivo Pessoal/Silvestre Martins)

Morador vizinho e companheiro de infância do (futuro) mestre do futebol-arte, Corradi se recorda da amizade defensiva. "O Telê era uma pessoa franzina, e eu não gostava que ninguém se aproveitasse dele", ressalta. "Para mim, ele foi um irmão. Conviver com ele era motivo de felicidade", completa.

Abreviada pelo padrão físico, a carreira de Telê como jogador durou pouco mais de dez anos. Todavia, antecedeu a experiência como treinador. Oito clubes e 28 temporadas, que valeram, entre outros títulos, dois Mundiais, duas Libertadores e dois brasileiros. Ele deixou o legado. Nos torcedores, restou a saudade.

Um técnico-pai

Dos seus ex-comandados, gratidão. "Telê Santana não treinava apenas o jogador, treinava o homem. Falava muito da moral, e preparava a cabeça dos jogadores. E era um perfeccionista. Mas, os benefícios que os atletas tinham, eram para torná-los eternamente gratos ao Telê, como centenas são, inclusive eu", diz Dadá Maravilha, Campeão Brasileiro em 1971, sob a batuta do mestre.

Homenagem: estátua na terra natal
(Créditos: Vinícius Dias/Toque Di Letra)

Recordista em partidas à frente do alvinegro - somou 434, Telê também demonstrou o lado paizão. "Ele era, acima de tudo, um homem, chefe de família. Gostava que o jogador se preocupasse com a família, com o seu patrimônio, e com o futuro. Se o cara comprasse um carro antes de uma casa, ele dava uma dura. O Telê foi muito útil à carreira de centenas de jogadores", completa.

EXEMPLO - Renê Santana, 55 anos, o único filho homem de Telê que, se estivesse vivo, teria completado 81 anos na última quinta-feira, viu o pai como um exemplo de caráter. "Foi um pai para mim e, dentro do possível, para os jogadores ou quaisquer jovens que conseguia conviver, passar o fundamental. A sua simplicidade, nem o dinheiro, ou a fama transformou", destaca.

O caráter inflexível, marca da personalidade do itabiritense, fez-se visível desde o começo da carreira. Renê se lembra bem. "O Fluminense era seu primeiro clube, jovem treinador. Ao sentir-se traído pelo preparador físico, comunicou à diretoria que não continuaria com ele. Mas o presidente quis que se entendessem. Pois eu estou fora, ele disse. Mesmo sem nenhuma proposta de trabalho, não se dobrou, e ficou desempregado. Fez questão de nos contar", encerra.

Marca na história

O memorial, sonho, não saiu do papel. Mas deixou notável marca. Como parte dos festejos do 84º aniversário de Itabirito, em 2007, a Prefeitura instalou na Travessa Domingos Pereira, Região Central, uma estátua, em tamanho real, do treinador. Trajando agasalho da Seleção Brasileira, Telê ostenta, na mão esquerda, uma bola com escudos das principais equipes que defendeu.